Confirmado benefício de duas vacinas pneumocócicas conjugadas em crianças no país  

A Meningite, uma doença causada por agentes infecciosos de origem viral, fúngica, parasitária e bacteriana, é um dos principais responsáveis pelas hospitalizações e mortalidade infantil no mundo, especialmente nos países em vias de desenvolvimento da Ásia e África, incluindo Moçambique.

Estima-se que, pelo menos, 1,2 milhão de casos de meningite ocorram por ano em todo mundo, em crianças menores de cinco anos de idade, 180 mil dos quais resultam em óbito.

No país, para fazer face à problemática desta doença, o Ministério da Saúde (MISAU), por meio do Programa Alargado de Vacinação (PAV), em 2013, introduziu a Vacina Pneumocócica Conjugada Dez-Valente (PCV-10) no Calendário Nacional de Imunização, abrangendo as faixas etárias mais acometidas pela doença, com base no uso do esquema vacinal três doses (2, 3 e 4 meses de idade; 3+0) .

Em Maio de 2019, a PCV-10 foi substituída pela PCV-13 em todo o país, obedecendo ao esquema vacinal 2+1 doses, numa introdução gradual que começou em Dezembro de 2017 no norte de Moçambique. A seguir, aborda-se o impacto da imunização contra a meningite numa entrevista feita pela equipa do INFoINS ao investigador do Instituto Nacional de Saúde (INS) Aquino Nhantumbo (AN).

INFoINS: Para que finalidade é que são indicadas as vacinas  pneumocócicas conjugadas (PCV-10 e PCV-13)?

AN: Estas vacinas são indicadas para a preveção de doenças causadas por Streptococcus pneumoniae, nomeadamente otite média, sinusites, bacteriemia, pneumonia, sepse e meningite em crianças.

INFoINS: Qual é   a diferença entre a PCV-10 e PCV-13?

AN: A PCV-10 e PCV13 são diferenciadas pelo número de serotipos contra os quais fornecem a protecção. A vacina PCV-10 é composta por dez serotipos (1, 5, 7F, 4, 6B, 9V, 14, 18C, 19F e 23F) de Streptococcus pneumoniae, conjugados com a proteína D do Haemophilus influenzae tipo b, toxoide tetânico e toxoide diftérico, e previne cerca de 78% das doenças pneumocócicas graves, enquanto a PCV-13 é composta pelos serotipos da PCV-10 mais serotipos 3, 6A, 19A de Streptococcus pneumoniae, conjugados com uma variante não tóxica da toxina da difteria conhecida como proteína CRM197, e previne cerca de 90% das doenças pneumocócicas graves.

INFoINS: A meningite bacteriana é uma doença grave e potencialmente fatal. Estima-se que 8 a 15 por cento das crianças com meningite acabam morrendo, mesmo com o diagnóstico precoce e tratamento, e cerca de 20% dos sobreviventes desenvolvem sequelas neurológicas graves e, muitas vezes, irreversíveis. Que benefícios é que as duas vacinas trazem para o sistema imunológico?

AN: As duas vacinas são benéficas, porque estimulam o sistema imunológico a produzir anticorpos de memória de longo prazo e a desenvolver uma resposta rápida de controlo à infecção natural, evitando a manifestação das formas mais graves e morte por doença pneumocócica.

INFoINS: Até que ponto estas vacinas evitam a morte de crianças por meningite?

AN: Estas vacinas evitam a morte por meniningite em crianças, uma vez que proporcionam uma protecção muito eficaz e duradoura contra  doenças pneumocócicas, quando as crianças são completamente vacinadas, isto é, se tiverem recebido as três doses da vacina, segundo o esquema vacinal recomendado. Além disso, estas vacinas reduzem o estado de portador nasofaríngeo e a disseminação das estirpes de Streptococcus pneumoniae,  garantindo a protecção indirecta a não vacinados.

INFoINS: Quando e por que é que as crianças devem ser imunizadas contra doenças pneumocócicas?  

AN: O processo de imunização contra doenças pneumocócicas deve ser iniciado quando a criança tiver a idade mínima de dois meses para a primeira dose, com intervalo mínimo de um mês entre as doses subsequentes, por exemplo, 2, 3 e 4 meses para proporcior uma protecção muito eficaz e reduzir o risco de desenvolver as formas graves de doenças pneumocócicas. Menos casos graves de doenças pneumocócicas significa menos mortes e menos gastos de tratamento e internamento nos hospitais.

INFoINS: O INS fez um estudo sobre o impacto destas vacinas em crianças com meningite. Fale do objectivo do estudo, resultados e suas conclusões.

AN: De facto, o INS realizou um estudo sobre o impacto das Vacinas Pneumocócicas Conjugadas (PCVs) em crianças, com o objectivo de  avaliar o impacto das duas vacinas na redução do peso da meningite pneumocócica em crianças menores de cinco anos de idade em Moçambique no período de 2013 a 2020.

Em relação aos resultados deste estudo, das 2.496 amostras de líquido cefalorraquidiano (LCR) testadas, 219 (8,8%) foram positivas para Streptococcus pneumoniae, 39 (1,6%) N. meningitidis e 72 (2,9%) H. influenzae. A proporção de casos de meningite pneumocócica reduziu de 33,6% (124/369) em 2013 para 5,0% (19/446) em 2020 (p <0,001). A frequência relativa dos serotipos cobertos pelas PCVs também reduziu de 89.5% (51/57) em 2013 para 33,5% (5/15) em 2020 (p < 0,001).

As principais conclusões dos nossos achados mostram que, com  a introdução das vacinas no calendário nacional de imunização, houve uma rápida redução do peso da meningite pneumocócica em crianças menores de cinco anos de idade em Moçambique. Esta redução foi acompanhada por uma mudança substancial no padrão dos serotipos pneumocócicos circulantes no país.

INFoINS: Como é que classifica o estudo realizado em relação ao seu grau de divulgação e utilização: tem sido muito abordado ou constitui algo “escondido”?

AN: Os resultados deste estudo têm sido muito abordados em diversos fóruns nacionais e internacionais. A nível nacional, foram apresentados e discutidos em diferentes sessões clínicas nos hospitais do país, em reuniões nacionais do PAV, das vigilâncias de doenças preveníveis por vacinas ao nível do INS, assim como nas Jornadas Nacionais de Saúde, promovidas pelo INS.

Além do acima exposto, estes resultados têm sido usados para a avaliação das medidas de prevenção e controlo disponíveis e orientam a tomada de decisões de saúde pública ao nível do MISAU.

A nível internacional, estes resultados foram divulgados em conferências internacionais, assim como em revistas internacionais indexadas, e têm sido usados pela Organização Mundial da Saúde como evidência científica sobre o impacto das PCVs na redução de doenças causadas por Streptococcus pneumoniae, especialmente na região da África.