PELA PRIMEIRA VEZ NO PAÍS: Detectada circulação de mosquito causador da dengue e febre-amarela

Através do mapeamento da ocorrência e distribuição de mosquitos vectores do arbovírus, causador de doenças como a dengue e febre-amarela, a bióloga e pesquisadora do Instituto Nacional de Saúde (INS) Ana Paula Abílio constatou a ocorrência, no distrito de Lago, na província do Niassa, de mosquitos do género Aedes luteocephalus, transmissores da dengue e febre-amarela.

A pesquisadora conceituou a Aedes Luteocephalus como uma espécie de mosquitos selváticos pertencentes ao género Aedes e subgénero Stegomyia, apresentando uma distinta faixa amarela que possui o mesmo comprimento no escudo tarsómero da pata traseira, com grande mancha pálida na base e duas áreas brancas grandes na região do bico.

De acordo com o Ministério da Saúde (MISAU), a dengue é uma doença viral, que causa síndrome febril aguda e grave, quando apresentada de forma hemorrágica. Trata-se duma arbovirose que afecta humanos, constituindo-se, por isso, num sério problema de saúde pública no mundo, especialmente em países tropicais, dadas as condições ambientais lá existentes.

Por sua vez, a febre-amarela, para além de apresentar uma síndrome febril, é uma doença hemorrágica viral aguda e icterícia, por mostrar, entre vários sintomas, a coloração amarela da pele e dos olhos, afectando pessoas de todas as faixas etárias.

Os insectos em referência afectam milhares de pessoas na África, incluindo comunidades da província do Niassa. A presença destes mosquitos no país, segundo a pesquisadora, decorre do facto de Moçambique apresentar um clima tropical apropriado para a reprodução da espécie.

A bióloga explica que os Aedes luteocephalus podem transformar-se num foco de transmissão das referidas doenças, preferencialmente em águas paradas dos buracos das rochas, árvores, folhas, caules de bambu, garrafas de plástico e outros recipientes artificiais com altura de até 9 metros, facto que pode ameaçar a saúde pública.

Ana Paula Abílio, bióloga

Neste contexto, Ana Paula Abílio esclarece que, como qualquer outra doença provocada pela picada de mosquito, a dengue e a febre-amarela podem levar à morte. Segundo ela, o vírus leva mais ou menos 4 a 6 dias de incubação no organismo humano. Depois disso, o infectado começa a apresentar sintomas.

“O sindroma febril, acompanhado de erupção cutânea e hemorragias dispersas, pode aparecer frequentemente na forma maisgrave da infecção pelo vírus da dengue e pode levar à morte do paciente”, realça. Os mais recentes dados do MISAU relativamente a mortes por malária indicam que, só no ano passado, a doença matou 435 mil pessoas no mundo, facto que, na opinião da entrevistada, deve despertar atenção sobre os cuidados a ter em relação à dengue e febre-amarela no país.

“É importante lembrar que os mosquitos da espécie Aedes luteocephalus são conhecidos como principais vectores de arboviroses não só da dengue e febre-amarela, mas também do zika e de outras, ocorrendo em todo o território moçambicano. Como exemplo, o país registou vários casos dessas doenças, incluindo dois surtos da dengue, em 2015 no Norte de Moçambique”, referiu.

Sobre as formas mais seguras de prevenção de doenças provocadas por arbovírus, a bióloga aponta o saneamento do meio, partindo da limpeza geral, que inclui o corte de vegetação, redução de fontes de águas paradas perto de habitações e locais públicos e privados, tapamento de recipientes de água destinada ao uso doméstico, utilização de repelentes e redes mosquiteiras.

O artigo científico em alusão tem como título “Primeira ocorrência confirmada de Aedes (Stegomyia) luteocephalus” e foi publicado na revista Journal Parasite & Vectores em 2020. No estudo, a pesquisadora colectou 92 mosquitos.

A análise, que foi realizada no Laboratório de Entomologia Médica do INS, consistiu na identificação taxonómica do material genético, tendo a pesquisadora usado especificamente a genitália cortada do mosquito macho para observação microscópica.

Outras etapas da pesquisa comportaram a extracção e amplificação do DNA das espécies estudadas para avaliação das sequências do material genético, análise filogénica para identificação das semelhanças das sequências das espécies estudadas com as encontradas no banco de genes internacionais. Nisso, a pesquisadora concluiu que 17 por cento destes pertencem à família Aedes luteocephalus.

Ana Paula Abílio reporta que, ao longo da pesquisa, teve dificuldades em obter uma cadeia de frio para conservar as amostras em todo o processo, pelo que transportar os mosquitos de Lichinga para o Laboratório de Entomologia Médica, em Maputo, foi o seu principal desafio.